BRF prevê aportes de R$ 55 bi em dez anos e quer triplicar de tamanho
09/12/2020 às 09:05

Para quem se gaba de rejeitar estripulias, Lorival Luz bem que surpreendeu. Em um lance de ousadia incomum na BRF, o CEO global da empresa anunciou hoje um pacote de investimento de R$ 18 bilhões para os próximos três anos. Se bem sucedido, o que é motivo de dúvidas no mercado, o plano quase dobrará a receita da fabricante de alimentos até 2023.

Até 2030, os aportes deverão chegar a R$ 55 bilhões, com o que a dona de Sadia e Perdigão prevê triplicar o faturamento em dez anos, superando R$ 100 bilhões. O mercado gostou, mas promessa é dívida.

A estratégia vai colocar a capacidade do time comandado por Luz à prova. Se é verdade que a BRF saiu do atoleiro nos últimos anos, também é fato que o investidor nunca se contentou com isso. Não à toa, os papéis da empresa ainda amargam baixa de 34,3% neste ano. O Ibovespa registrou queda de 1,6% no ano.

Sem crescimento, a BRF parecia fadada à estagnação, o que já gerava incômodo em acionistas históricos. “Falta mais faca nos dentes. O pessoal está na trilha certa, mas é vagaroso”, dizia um investidor nas últimas semanas. Com o pacote de investimentos, a empresa busca inverter o jogo.

Por ora, o mercado parece ter comprado a tese. Na esteira do plano decenal, as ações da BRF dispararam. No fechamento, subiram 8,7%, o que levou o valor de mercado da empresa a R$ 18,8 bilhões — ainda distante do auge de R$ 63 bilhões de 2015.

Para cumprir as promessas, a BRF precisa pisar no acelerador. No próximo ano, os investimentos devem somar R$ 5 bilhões, sendo R$ 1,9 bilhão em aportes usuais — ativos biológicos e arrendamentos — e o restante para crescimento. Não é pouca coisa. Nos últimos doze meses até setembro, foram 2,3 bilhões. Na primeira fase do ciclo de investimentos, até 2023, serão R$ 18 bilhões. De 2024 a 2026, um montante semelhante será aplicado, e o restante deverá ser desembolsado até 2030.

A BRF confia que, com as contas arrumadas — o prazo médio de vencimento das dívidas é de nove anos —, o balanço está preparado para o ciclo de crescimento. Durante evento virtual com investidores para anunciar a “Visão 2030”, o vice-presidente de finanças e de relações com investidores, Carlos Moura, afirmou que o crescimento ocorrerá com endividamento controlado. A empresa estipulou o limite prudencial para o índice de alavancagem (relação entre dívida líquida e Ebitda) em 3 vezes. No fim de setembro, esse indicador estava em 2,9 vezes, mas deverá cair com a geração de caixa e a desvalorização do dólar registrada neste trimestre.

Ao mesmo tempo em que investe, a BRF quer voltar a distribuir dividendos aos acionistas, algo que não ocorre há cinco anos, no período que vai de 2021 a 2023. Conciliar as duas tarefas é uma missão para Moura.

No horizonte está a entrada da BRF em mercados desenvolvidos, como EUA e Europa. Mas a expansão internacional desejada pela BRF mostra uma diferença em relação à estratégia da JBS, que fatura mais de R$ 200 bilhões e que ergueu uma plataforma global de fazer inveja às titãs da carne. A Tyson só começou sua internacionalização recentemente, e ainda é muito americana. A empresa dos irmãos Batista, por sua vez, se estabeleceu na América do Norte, Oceania e Europa a partir do abate, passando ao processamento e, mais recentemente, ampliando a área de industrializados e de marca.

Na BRF, uma operação verticalizada como a da concorrente brasileira não está em jogo. Entrar na atividade de abate nos EUA seria mais difícil, dada a concentração desse mercado em frangos e suínos, áreas de atuação da dona da Sadia. E a operação de abate também é menos rentável, o que iria de encontro à estratégia de ganhar margem.

Nesse cenário, parece claro que a BRF busca a aquisição de negócios de alimentos processados e com marca, num modelo mais parecido com a americana Hormel. A centenária empresa de alimentos produz carne de porco, mas diversificou as operações com itens como pasta de amendoim e produtos nutricionais. A Hormel é uma das “aristocratas” da S&P, grupo de empresas que paga dividendos crescentes há 25 anos.

Entre fontes que conhecem a BRF, a recomendação é de cautela. “Parece uma promessa de campanha. Dez anos é muito tempo”, avaliou um experiente executivo. Antes de qualquer veleidade aristocrática, a BRF terá de provar que o anúncio multibilionário não ficará no vazio.

Aos analistas, o chairman Pedro Parente evocou a palavra de quem entrega o que promete. “Encontramos uma empresa com muitos problemas e fizemos o que dissemos [que faríamos]. É com a autoridade de quem trabalha duro para entregar o que promete que esse time veio aqui, com coragem, para apresentar um plano que é tão ambicioso”.

Fonte: Valor Econômico

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