Enquanto repõe mercadorias no setor de hortifruti do supermercado Super Nosso, no bairro Cruzeiro, na região Centro-Sul da capital, o refugiado Roberto Lugo, 54, lembra-se com saudade dos tempos em que ganhava a vida como comunicador no comando de um programa em uma rádio na Venezuela. “Era a minha paixão”, conta o imigrante, que agora aprende o novo ofício.
O que, para muitos, poderia ser visto como um rebaixamento profissional é para Lugo a grande oportunidade de recomeço. “Vejo com muita satisfação o fato de as empresas estarem abrindo as portas para nós e pedimos encarecidamente que continuem a fazer isso”, diz o venezuelano, em tom de agradecimento à empresa que o acolheu.
Atento à chegada cada vez mais frequente de refugiados à capital mineira – somente em 2019, foram ao menos 200 pessoas, segundo levantamento da Cruz Vermelha –, um grupo de empresários do setor de comércio de Belo Horizonte tem desempenhado papel social importante na luta contra essa crise humanitária ao oferecer oportunidades de trabalho a imigrantes venezuelanos.
Segundo a analista social do Serviço Jesuíta a Migrantes e Refugiados (SJMR), Nathalia de Oliveira, mais de 30 empresas parceiras da entidade já abriram vagas para imigrantes, tornando-se fundamentais para completar o processo de interiorização dos venezuelanos que chegam à capital. “Os imigrantes ficam em casas de passagem por três meses, mas, enquanto não conseguem emprego, eles não têm condições de sair dos abrigos. Por isso, o papel social das empresas é importante para dar autonomia e uma oportunidade de recomeço ao refugiado”, avalia Nathalia.
Muitos refugiados que chegam a Belo Horizonte são profissionais com formação superior. Entre os imigrantes estão professores, engenheiros e policiais que esperam algum tipo de oportunidade. Mas, segundo a analista social do SJMR, todos sabem como é difícil validar um diploma no Brasil e, por isso, aproveitam a possibilidade de trabalhar em funções que exigem menor escolaridade.
Gerente de recrutamento e seleção do Grupo Super Nosso, Flávia Oliveira afirma que, ao empregar refugiados, o meio empresarial se beneficia com a troca de experiências e de cultura. “A gente percebe que essas pessoas são gratas pela oportunidade que recebem e respondem com trabalho e responsabilidade”, observa.
Dono do restaurante Saboreando, no bairro Padre Eustáquio, na região Noroeste de Belo Horizonte, Saulo Vidigal mantém um venezuelano em seu quadro de funcionários há oito meses e está bastante satisfeito. “É um grande funcionário. Meus clientes são loucos por ele”, diz o comerciante.
Vidigal conta que não teve dificuldade para empregar formalmente o venezuelano, que já havia regularizado documentos que comprovam a condição de refugiado no Brasil. Hoje, o empresário não descarta a contratação de outros na mesma situação: “Caso uma pessoa chegue com vontade e queira trabalhar, a casa está aberta”.
Imigrantes dizem que em Minas há mais oportunidades
Outro setor que tem apostado na qualidade da mão de obra dos refugiados é a indústria mineira, que abre caminho para imigrantes se reerguerem por meio do trabalho. Proprietária da fábrica Trapézio Bolsas, no bairro Ermelinda, na região Noroeste da capital, a empresária Elizete da Silva Batalha abriu vagas para dois haitianos e dois venezuelanos nos últimos sete meses. “É uma questão de humanidade. O fato de saber que eles passavam dificuldades e não tinham o que comer me fez trazê-los”, justifica a empresária.
Em Contagem, na região metropolitana, a empresa Polar Refrigeração também não impôs barreiras para dar emprego a imigrantes. Recentemente, a fábrica contratou o venezuelano Misael Rios, 31. Ele desembarcou em Belo Horizonte há dois meses e ainda não tinha experiência no setor. Por esse motivo, foi contratado para executar o serviço mais básico, na expedição. “Mas se mostrou tão interessado em trabalhar que, só pela postura, foi promovido no dia seguinte”, contou a diretora da empresa, Izabella Cypriano.
Empregado há duas semanas, Rios se diz grato pela oportunidade que o mercado mineiro lhe deu. “Quando estava em Roraima, só trabalhava como voluntário, sem salário. Agora, vou focar as oportunidades melhores que tenho”, diz o refugiado. Questionado sobre o que fará com o primeiro salário, ele conta que vai cuidar da mulher que está no Brasil, mas precisa enviar dinheiro para a Venezuela, onde estão quatro filhos.
O caminho para contratar um refugiado
Em Minas, o Serviço Jesuíta a Migrantes e Refugiados (SJMR) intermedeia o contato entre refugiados a procura de trabalho e empresas que oferecem vagas para imigrantes que foram obrigados a abandonar seu país. O SJMR fica na avenida Amazonas, 641, 8° andar, no centro de BH. Outras informações podem ser obtidas pelo telefone (31) 3212-4577.
(Fonte: O Tempo)
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