Carrefour se ajusta a nova fase de aberturas
29/05/2018 às 10:20

Noël Prioux, presidente do Carrefour Brasil, vai até a gôndola de refrigerados, onde estão sucos e saladas prontas, produzidos e vendidos na loja da Marginal Pinheiros, zona sul de São Paulo. "Isso aqui tem que vender até o fim do dia. Ou vende ou se perde. Não dá para deixar nada para o dia seguinte". São produtos rentáveis - meio litro de suco custa de R$ 6 a R$ 7, por exemplo - dispostos em áreas nobres em frente a entrada das lojas. É a região dos perecíveis, considerada a nova zona de guerra dos hipermercados. Grandes redes globais como Walmart e Target reformaram seus pontos recentemente e ampliaram os espaços dessas seções em detrimento de outras, como eletrônicos.

É um movimento sustentado pela mudança de hábitos do cliente, que busca itens mais saudáveis. "Estamos colocando produtos em bandejas menores. Por que embalar dezenas de camarão para a venda? Você embala pouco por um preço mais acessível", diz Prioux, em sua primeira entrevista desde que se tornou CEO, em outubro. A categoria de frescos e orgânicos é um dos focos do plano de transformação global do Carrefour, anunciado em janeiro. Com margens mais altas, esses produtos ganham destaque num momento em que a rentabilidade das supermercadistas tem sido acompanhada mais de perto pelo mercado.

No caso do Carrefour, isso ocorre por duas razões centrais: a rápida expansão da venda on-line e a decisão de abrir mais lojas, fatores que afetam as margens e que podem gerar efeitos no balanço da rede em 2018.

A operação de supermercados e hipermercados do Carrefour sentiu o maior peso da venda on-line nos indicadores. Em parte por isso, a margem bruta total caiu e a margem Ebitda, que mede lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação, ficou estável no primeiro trimestre do ano.

"Tivemos um crescimento absurdo do on-line, de 103% [de janeiro a março] e ele tem margem menor", disse a analistas o diretor financeiro Sebastien Durchon, em teleconferência sobre o resultado trimestral. A venda on-line, que respondeu por 6% do total nos três primeiros meses do ano (sem incluir gasolina), deve fechar 2018 um pouco abaixo dos 10%, apurou o Valor.

Já no Atacadão, rede de atacarejo grupo, a rentabilidade subiu apesar do ritmo acelerado de expansão de lojas. Aberturas elevam despesas e pressionam o Ebitda, mas mais de 80% da alta do indicador veio de créditos fiscais. Uma parcela menor foi atribuída a "ganhos de eficiência operacional".

Apesar do risco do impacto da expansão do site e das aberturas de pontos, o Carrefour defende a manutenção dessas estratégias. O grupo diz que, isoladamente, a margem dos supermercados e dos hipermercados não cai. É que quando se joga a taxa de rentabilidade do site no índice geral, o indicador final acaba caindo. E na margem com a venda de alimentos, onde as rentabilidades são maiores, houve deflação.

A direção afirma que, para cada negócio, tem tomado medidas para absorver eventuais efeitos dessas estratégias.

A rede vai acelerar, por exemplo, a automação em lojas e centros de distribuição. Sem detalhar, Prioux diz que há pilotos testados na França que devem ser replicados no Brasil. Isso tende a reduzir despesas do braço de varejo. Até o fim do ano, a empresa pretende colocar máquinas de autoatendimento em cerca de 80% do 76 postos de combustível da empresa. Há 12 postos com esses totens hoje. Há ainda efeito de renegociações de contratos com fornecedores e prestadores de serviços.

Já no Atacadão, para absorver a expectativa de aumento de 5 mil empregados ao ano - correspondente à abertura de 20 lojas a cada 12 meses - a elevação das vendas, com os novos pontos, pode ajudar a diluir os custos. Mas com as despesas da rede subindo mais que a receita, que é afetada pela deflação dos alimentos, essa diluição é mais lenta. Serão 20 novas lojas Atacadão ao ano, por pelo menos três anos, apurou o Valor.

"Poderíamos não abrir lojas ou abrir menos, mas essa não é a questão. É preciso ter uma estrutura de negócios que equilibre isso, e é algo que nós temos", diz Prioux. "São quatro negócios - varejo, site, banco e atacado - que fazem parte de um único ecossistema. Os cartões fornecem dados para conhecermos melhor o cliente e vendermos mais na loja. Tudo se comunica", acrescenta.

As inaugurações vão se acelerar apenas no Atacadão - serão 20 novas lojas, ante 11 aberturas em 2017. Na bandeira Carrefour Express serão 20 pontos novos e no Carrefour Market, 10. Em 2017, só no Carrefour Express foram quase 50 inaugurações. "Estamos ajustado nossa 'paleta' de modelos a nossa capacidade de tocar os projetos. Não dá para tocar tudo", diz Prioux. Este ano, 20 hipermercados devem passar por reforma. O investimento total do grupo na operação brasileira será de R$ 1,8 bilhão, mesma soma de 2016 e 2017, segundo os balanços.

Prioux afirma que a empresa tem que se preparar para um novo modelo de operação, saindo da deflação de alimentos neste ano - a queda de preços era de 4% até março - para uma inflação na faixa de 2% a 3% nos próximos anos.

"É um outro modelo porque ele garante alguma inflação. Não que isso seja bom, a questão é que deflação é ruim e muita inflação também não é nada bom. Então com um pouco de inflação vejo menos dificuldades", diz. "O Itaú chegou a mencionar uma inflação de 4% neste ano, acho que não fica nisso tudo."

Com alguma inflação, há ganho no volume vendido ao mesmo tempo que se tem um reajuste de preços que pode levar a uma receita mais vigorosa. Com a deflação, não há aumento em volume que compense o preço menor.

Questionado sobre os efeitos da greve dos caminhoneiros no negócio, Prioux disse que a decisão de limitar a venda de certos produtos nas lojas do Carrefour a cinco unidades por CPF é uma forma de garantir o direito de compra de todos os consumidores.

Outras grandes varejistas como Walmart e Cencosud têm limitado as vendas a 5 a 10 itens, a depender do produto em falta em cada loja. No Carrefour, o estoque geral varia de 30 a 40 dias, sendo que os itens de alto consumo (leites, pães, laticínios) tem estoque de 8 a 10 dias.

"O único caminho possível ao governo é o do debate, do diálogo. Acreditamos que haverá um aumento inicial nas compras, com consumidores estocando alguns produtos, e depois, se essa manifestação continuar, pode haver uma queda na venda [com o desabastecimento]", disse ele, em entrevista na quinta-feira passada.

(Fonte: Valor Econômico)

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