Filial no Brasil gera conflito no Cencosud
13/07/2018 às 10:15

O futuro da operação do grupo varejista Cencosud no país tem gerado divergências dentro da companhia chilena, dona de redes de supermercados como G.Barbosa e Prezunic.

Existem discordâncias entre a linha de frente da companhia e o controlador, o alemão naturalizado chileno Horst Paulmann, sobre a venda do negócio no Brasil.

O CEO do grupo, Jaime Soler, tem defendido a saída da empresa do país por acreditar que o negócio deve continuar consumindo recursos, sem a perspectiva de recuperação dos investimentos a curto e médio prazos.

Paulmann, fundador da empresa e com perfil centralizador, chegou a sondar o mercado em 2015 para verificar potenciais interessados no negócio como um todo, mas é contra a venda da operação neste momento, apurou o Valor.

Para o empresário, uma negociação nas condições atuais, com resultados ainda fracos, depreciaria o ativo. Também poderia passar uma percepção negativa aos investidores, já que o grupo anunciou, em 2017, um plano de desinvestimentos para reduzir a alavancagem - sem incluir o Brasil.

A Cencosud é a quarta maior supermercadista do país, dona da rede Prezunic, no Rio de Janeiro; da sergipana G.Barbosa; da mineira Bretas; e das baianas Mercantil Rodrigues e Perini.

Essas diferenças sobre a forma como Soler e Paulmann veem a operação local pesaram na decisão de Soler de renunciar ao cargo de CEO, apurou o Valor. No fim de junho, a Cencosud informou que o executivo deixará a função, numa movimentação que surpreendeu os investidores.

Soler, que alegou "razões pessoais" para a renúncia, permanece no cargo até 30 de setembro. A saída foi negociada para evitar maiores ruídos na transição, inclusive já com a escolha de Andreas Strobel, CEO da Enel Distribución, como novo CEO.

O grupo soma 200 lojas e R$ 2 bilhões em vendas de janeiro a março no Brasil, segundo cálculos do Valor com base no câmbio informado no balanço do primeiro trimestre de 2018. Em reais, há queda nas vendas de 2,3% sobre o ano anterior. Em 2017, a retração foi de 5,5%.

O futuro da Cencosud no país tem sido objeto de conversas entre executivos do setor de supermercados nas últimas semanas.

Uma fonte próxima ao grupo chileno disse que a Cencosud estaria considerando a hipótese de se desfazer da operação brasileira se a recuperação econômica não se acelerar. "Eles entendem que o fundo do poço já passou, e é isso que ainda sustenta os planos de manutenção dos negócios no país por enquanto. Mas há claramente uma frustração", diz um ex-executivo da companhia.

Em 2015, a hipótese de venda chegou a ser analisada, mas com a perda no valor da operação, e em meio à recessão econômica, a ideia não avançou. "A intenção na época era melhorar o negócio antes de vender. Já se passaram três anos e não há uma recuperação mais rápida nos números. No cenário atual, vender seria perder dinheiro", diz o ex-executivo.

Procurada, a Cencosud negou a possibilidade de sair do país. Sobre a existência de discordâncias no comando, a empresa preferiu não se manifestar.

A Cencosud entrou no Brasil em 2007 e, até 2011, gastou cerca de R$ 3 bilhões em aquisições. Em 2012, gerava R$ 9,7 bilhões em vendas brutas. Em 2017, esse valor caiu para R$ 8,5 bilhões, segundo os rankings da Associação Brasileira de Supermercados (Abras).

Ao se avaliar os números do primeiro trimestre, alguns indicadores mostram avanços. As redes Prezunic e G.Barbosa tiveram melhora nas vendas de lojas com mais de um ano de operação (o indicador "mesmas lojas"). E a rede Bretas teve neste ano a primeira taxa de crescimento nesse quesito desde 2014. Mas ainda não há indicação clara de uma virada nos números da companhia.

A empresa menciona esses avanços no último balanço, mas afirma que a "deflação de alimentos e o fechamento de 11 lojas no último ano", além da piora econômica nas regiões onde atua, afetaram os números de 2018.

O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação) foi negativo de janeiro a março em cerca de R$ 60 milhões. O lucro bruto em supermercados no país caiu 19%.

Em relatório em abril, a equipe da agência de rating Moody's reafirmou a nota da empresa chilena em Baa3, mas mudou a perspectiva de estável para negativa. Observou que o alto índice de endividamento ainda deve pressionar o negócio em 2018 e 2019, apesar das iniciativas de desalavancagem.

"Os ratings levam em conta a melhoria nas políticas financeiras da companhia nos últimos trimestres e o compromisso da administração com medidas financeiras mais fortes e uma estrutura de capital conservadora. Por outro lado, a alta alavancagem e sua presença relevante em países desafiadores, como Argentina e Brasil, limitam sua classificação", afirmou a Moody's.

Desde março, executivos da linha de frente deixaram o negócio - e a companhia ainda não tem novo CEO no país.

O diretor-geral das redes G.Barbosa e Perini, Ivo Benderoth, pediu demissão semanas atrás e, antes dele, deixou a empresa José Rafael Vásquez, diretor do Bretas. Benderoth foi para a varejista Casa & Vídeo e Vásquez para a rede de farmácias Pague Menos.

Em março, Cristián Gutierrez deixou o cargo de presidente da companhia e voltou ao Chile. Sebastián Los, diretor de administração e finanças, ainda é o interino na posição.

Ex-executivos ouvidos pelo Valor nos últimos dias identificaram aspectos que podem ajudar a entender a atual situação do grupo. Um deles é a falta de uma liderança de peso no comando, com conhecimento do varejo brasileiro. Ainda citam dificuldades na integração dos negócios comprados - os sistemas de gestão chegaram a dar problemas na instalação. "Falta um CEO de peso, que conheça o mercado brasileiro, que se relacione bem com fornecedores e tenha autonomia", diz um ex-diretor.

(Fonte: Valor Econômico)

 

 

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