CENÁRIOS 2022: INCERTEZAS, SIM; DESÂNIMO, NÃO
09/02/2022 às 11:24

O que vem por aí no varejo supermercadista e na economia neste ano de 2022?

É fato que ninguém espera por facilidades, mas é igualmente verdade que o empresariado brasileiro está acostumado a enfrentar e superar crises, incertezas e os mais diversos desafios. Entretanto, há sinais de que melhores dias estão próximos.  

Este novo ano reserva muitas expectativas, principalmente no campo político e econômico, sempre trazendo reflexos para o varejo. O que já é certeza é que, como é ano eleitoral será um período de incertezas, de planejar com mais atenção os investimentos tanto em expansão quanto na formação do mix.  Afinal, como estará o consumidor ao longo de 2022? Com mais empregos? Com mais renda? Já livre da pandemia que castigou o mundo nos últimos dois anos?

O fim da pandemia do novo Coronavírus – aliás, talvez seja a principal expectativa para 2022, com o avanço da vacinação  cobrindo  praticamente  100%  da  população,  e  a  consequente  retomada  dos  diversos  setores  econômicos  –,  é  o melhor sinal. Mas fica a torcida forte para que não haja uma recaída ou uma nova onda do vírus.   

Para  onde  os  investidores  sempre  olham,  o  Relatório  de Mercado Focus, do Banco Central, mesmo com previsões, pode-se  dizer,  moderadas,  joga  alguma  luz  nesse  caminho.  Considerando  o  último  boletim  antes  do  fechamento  desta  edição,  o  de  10  de  dezembro  de  2021,  as  previsões  indicam  um crescimento da economia de 0,50% em 2022. Isso sobre um desempenho de 4,65% em 2021.   

Os economistas normalmente usam a expressão “Ceteris Paribus”, que em Latim que significa algo como “se todo o resto se mantiver constante”, indicando que as perspectivas  serão  de  mais  estabilidade  de  preços no ano de 2022. Certamente uma boa notícia para o varejo supermercadista e para o consumidor  em  geral,  tão  penalizado  pela  inflação  ultimamente.   Para  o  Focus,  o  IPCA  em  2022  deverá  ficar  em 5,02%, o que é menos da metade da inflação de  12  meses,  até  novembro,  que  foi  de  10,74%,  a  maior  para  o  período  desde  2003.    As  projeções  para  a  Selic  são  de  11,50%  e  o  câmbio  real/dólar em R$ 5,55.

QUESTÃO FISCAL

O economista Mauro Rochlin,  professor de MBA da FGV, “e botafoguense” – como faz questão de  deixar  claro  –,  concorda  com  as  projeções  do  Focus. Ele prevê, ainda, que a taxa de desemprego desça a 12% até o final de 2022.  No entanto, uma melhora  considerável  na  renda  só  virá  em  2023,  diz ele.   

Por outro lado, o professor avalia que “o Brasil  está  muito  barato”  com  o  câmbio  no  patamar  atual, o que pode incentivar os investimentos ex-ternos  por  aqui.  Mas  ele  alerta:  “O  governo  tem  que estar preocupado com a questão fiscal”.   

Porém,  o  próprio  Rochlin  analisa  a  dificuldade  de  se  adotar  uma  política  fiscal  severa  sem  atender o “clamor social” por programas de socorro à população sem renda, como a ampliação dos auxílios pagos pelo governo federal.  

ELEIÇÕES

Sobretudo  num  ano  eleitoral,  será  difícil  o  governo  ter  essa  severidade.  Afinal,  a  eleição  deverá  impactar  fortemente  a  economia  do  País  neste ano. “Muitos gostariam de desassociar e economia  e  eleições.  É  impossível”,  enfatiza  o  doutor  em Ciência Política e professor da PUC Minas, Malco Camargos.  

Ele  detalha  que  será  um  ano  em  que  a  atividade  produtiva  no  País  estará  dependente  da  campanha  eleitoral.  “A  economia  impacta  as  eleições,  pois  se  o  cidadão  está  satisfeito  com  o seu desempenho econômico e com o desempenho  econômico  do  País,  ele  vota  na  situação;  se  está insatisfeito, ele vota na oposição”, ilustra.  

De outro lado, analisa Camargos, as eleições impactam a economia também do ponto de vista de atração de investimentos. “O mercado financeiro faz previsões de chance de vitória de cada um dos candidatos e, a partir da expectativa, precifica o valor das ações, precifica as trocas que serão realizadas. Haverá sempre muita volatilidade em ano eleitoral”, prevê.    

A  boa  notícia  de  que  a  inflação  vai  cair  já  é  um  alento  para  o  setor  produtivo,  que  poderá  prever melhor como vai ser a atuação das companhias em um cenário de mais estabilidade. Mas a inflação vai mesmo cair?

INFLAÇÃO

O professor Rochlin, da FGV, em entrevista a GÔNDOLA  e  em  artigo  distribuído  à  imprensa  no  início  de  dezembro,  garante  que  sim.  Ele  apresenta quatro fatores para justificar a tese.   “A despeito da descrença geral, a taxa de inflação deve apresentar  uma  forte  queda  nos  próximos  meses.  Quatro  fatores  embasam  essa  posição.  O  crédito  caro  é  o  primeiro  motivo.  A  taxa  Selic  deve  superar  o  pata-mar de 11% em 2022. O atual ciclo de alta tem afetado fortemente o custo dos empréstimos”, analisa.   

Ele aponta como segundo motivo a taxa de câmbio  estável,  já  que  a  moeda  americana  apresenta estabilidade na comparação anual e até em queda em relação ao pico de 2020. “Sendo assim, do lado cambial, o cenário também é positivo”.   

A estabilidade no preço das commodities é o  terceiro  ponto,  segundo  Rochlin.  “Os  preços  de  matérias-primas  estratégicas,  como  minério  de  ferro,  soja,  milho  e  petróleo,  registraram  recuos  importantes no último trimestre”.  

Para  ele,  considerando  a  ausência  de  choques  externos  no  atual  cenário,  e  ponderando  o  movimento  mais  recente  dos  preços,  a  possibilidade  de  um  novo  ciclo  de  alta  se  revela  remota.  “Junto a isso, previsões de uma boa safra no Brasil sugerem que a oferta de bens não duráveis estará suprida.”  

CADEIAS GLOBAIS

O quarto fator é representado pela “robusta, ainda que lenta”, recomposição das cadeias produtivas globais. “Semicondutores, material eletroeletrônico,  produtos  químicos,  laminados,  fertilizantes e toda uma gama de bens intermediários cujos processos  produtivos  haviam  sido  interrompidos  voltaram  à  produção,  à  plena  carga.  O  impacto  que essas cadeias de abastecimento sofreram, em termos  de  custos,  tende  a  abrandar,  o  que  deve  aliviar pressões inflacionárias do lado da oferta”.   

Por  fim,  ele  analisa  que  o  IGP-M  “vem  descendo ladeira abaixo” e o índice de preços ao atacado (IPA), que corresponde a 60% do IGP-M, depois  de  ter  atingido  o  patamar  de  50%,  em  maio  de  2021,  despencou  para  26%,  em  novembro  de  2021, no acumulado de 12 meses.  “Essas quedas expressivas, resultado da recente redução no preço  de  importantes  commodities,  são  o  prenúncio  do que vai acontecer com o IPCA. O arrefecimento dos preços na indústria terá forte reflexo nos balcões das lojas nos próximos meses, com impacto importante  nos  índices  de  preço  ao  consumidor.  Em resumo: a inflação vai cair!”, assegura.

SETOR ESSENCIAL E RESILIENTE

 “Temos  a  certeza  de  que  vai  ser  mais  um  ano de muito trabalho no Grupo DMA. Vamos continuar crescendo e expandindo, abrindo lojas e gerando  cada  vez  mais  empregos.”  A  fala  do  diretor  de  Marketing  do  Grupo  DMA,  Roberto  Gosende,  resume  bem  como  deverá  ser  a  atuação  dos  supermercados neste ano: sempre com muito trabalho  e  otimismo  e  ciente  das necessidades de  um  ramo essencial à vida das pessoas e à economia.   

Assim  como  na  DMA,  segundo  maior  grupo supermercadista mineiro, em todo o segmento em Minas Gerais os investimentos em expansão, melhorias  de  lojas  e  ajustes  para  melhor  atender  ao cliente vão continuar. Grandes redes do Estado e  pequenos  supermercados  já  informaram  essa  intenção.  A rede BH, maior do Estado e que teve forte expansão em 2021, também confirma que vai manter os investimentos em 2022.

O Mart Minas Atacado e Varejo, por ocasião do aniversário de 20 anos da rede, comemorados de 1º de setembro a 17 de outubro de 2021, também  já  havia  adiantado  a  manutenção  do  ritmo  de crescimento para 2022.  “Dentro do nosso plano de expansão, pretendemos inaugurar mais dez unidades,  em  polos  urbanos  estratégicos  de  Minas Gerais, totalizando 60 lojas até o final do próximo ano”, disse na época o Diretor Comercial e de Marketing do Mart Minas, Filipe Martins.  O Grupo ABC, sediado em Divinópolis, também anunciou, ainda em novembro, a abertura de mais 10 unidades em 2022, com a primeira delas já em janeiro.  

O Grupo Super Nosso divulgou, em novembro,  o  plano  de  expansão  até  2030,  que  prevê,  já  em  2022,  forte  expansão.  A  previsão  é  de  fatura-mento de R$4 bilhões (a estimativa de fechar 2021 com R$ 3,40 bilhões). Um grande passo para este ano  é  a  expansão  para  o  interior,  onde  o  Grupo começa e investir. “Em maio, por exemplo, vamos inaugurar  a  primeira  loja  Apoio  Mineiro  fora  da  RMBH, na cidade de Curvelo”, afirmou na época o vice-presidente do grupo, Rodolfo Nejm.

DESAFIOS E OPORTUNIDADES   

O  Sócio-Diretor  do  Supermercados  União,  com cinco lojas em Araguari, no Triângulo Mineiro, Ismael Carrijo, avalia que a economia em 2022 vai trazer  muitos  desafios,  mas  também  oportunidades.  Ele  acredita  que  o  setor  vai  manter  o  crescimento  neste  ano,  e  para  isso  vai  continuar  investindo.  “Temos  a  expectativa  de  um  crescimento  real de 10% em 2022, nas mesmas lojas”, projeta.  Como  pontos  que  podem  contribuir  com  a  melhora  do  cenário  e  do  setor,  Carrijo  aponta  fatores  como  o  auxílio  de  R$  400,  pago  pelo  governo  federal  “para  uma  faixa  expressiva  da  população”;    a    boa    disponibilidade    no    Brasil    de commodities  e  a  economia  voltando  ao  normal,  com  geração  de  emprego  e  renda.  Cita  ainda como um ponto altamente positivo que parte expressiva da população já está com a vacinação completa.   

A  mudança  no  comportamento  da  sociedade  também  poderá  influenciar  positivamente  a economia e o varejo supermercadista em 2022. “Parte dos consumidores assimilou uma nova rotina de voltar a fazer comida em casa e de receber pessoas,  o  que  aumenta  o  consumo  no  supermercado”,  analisa.  Ele  lembra  que  pela  rotina  que  o setor adotou de antissepsia nas lojas e por parte dos  funcionários,  os  supermercados  passaram  a  ser vistos como local ainda mais seguro.  

É  com  essa  expectativa  positiva  que  a  empresa  está  se  preparando  para  sua  expansão  ao  longo do ano, seja de forma orgânica ou até compra  de  novos  pontos  de  vendas.  “Sim,  já  estamos  investindo  em  reforma  e  adequação  de  lojas  e  vamos  continuar  investindo  pesado  no  próximo  ano.  Além  de  estarmos  planejando  a  abertura  e/ou aquisição de novas lojas”, confirma Carrijo.  

Por outro lado, mesmo com expectativa positiva, ele avalia que há riscos que devem ser considerados, como a “sempre eminente possibilidade de um novo vírus”, que pode exigir novas adaptações, afastamento de funcionários  e o “pavor” da população.   

De   forma   geral,   Ismael   Carrijo   acredita  num  crescimento  sustentável  da  economia.  “O  País  tem  vários  desafios.  Porém  suas  instituições  estão  preservadas,  mesmo  com  dificuldades;  o  setor  agro  e  a  pecuária  estão  muito  fortes  e com alta tecnologia de produção; a geração de emprego  está  crescente  e  existe  hoje  uma  maior  ‘adaptação’ ao vírus e consequentemente a novas variantes que possam surgir”.  

Dentro da loja, Carrijo faz uma projeção de que categorias de produtos devem ter mais crescimento neste ano. Ele cita, por exemplo, os produtos pets,  que,  afirma,  já  é  uma  categoria  crescente,  e  com  a  pandemia  as  famílias  adotaram  mais  animais. As comidas prontas ou semiprontas, para levar, carnes e bebidas, pelo hábito maior do churrasco em casa com amigos e família, e os produtos naturais, são outras apostas.   

REABERTURA DE OUTROS SETORES  

O sócio-proprietário do Supermercado Pais e Filhos, com cinco lojas em Juiz de Fora e a sexta unidade já anunciada para este ano, Marco Antônio Fernandes, avalia que 2022 será um ano “desafiador” para o setor supermercadista, já refletindo o que foi, principalmente, o segundo semestre de 2021,  em  que  a  “sensação  de  pós-pandemia”  fez  com  que  muitos  outros  setores  voltassem  a  funcionar.    

Ele  avalia  que  isso    provoca  concorrência  maior  no  setor  na  tentativa  de  manter  as  vendas  em patamares, pelo menos, parecidos com o período  mais  agudo  da  pandemia.  “Na  contramão,  temos  o  consumidor,  cada  vez  mais  procurando  ofertas, migrando para marcas mais baratas e, em determinadas  camadas  sociais,  com  o  poder  de  compra  reduzido.  Além  de  tudo  isso,  temos  um  cenário  de  inflação,  juros  altos  e  crédito  escasso”, pondera.  

O grande “dever de casa” para o setor supermercadista,  alerta  Marquinhos,  será  se  debruçar  sobre os números e trabalhar pesado na redução de  despesas  e  gestão  do  próprio  negócio.  “Mas  não dá para ser pessimista, pois aprendemos sempre  com  as  adversidades,  e  muitas  vezes  melhoramos  o  nosso  negócio  e  encontramos  grandes  oportunidades para sairmos fortalecidos”, ressalta.  

Esse argumento é parecido com o que pensa  o  proprietário  do  Supermercado  J. Alves,  com  uma loja em Caratinga e outra em Manhuaçu, José Cláudio Alves:  “Acho que a gente tem de ser otimista; vamos ter que aprender a lidar com as mudanças, com as crises”, diz ele.   “Não é porque está escuro  que  vamos  fechar  as  portas  e  dormir”,  recomenda.

Matéria publicada originalmente na edição 302 da revista GÔNDOLA

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